Em Odemira, em 2021 um surto de Covid-19 expôs os problemas relacionados com a população de migrantes estrangeiros que habitavam e trabalhavam na região.
Cerca de 40 pessoas, que integram uma rede organizada a partir do distrito de Beja, foram recentemente detidas e acusadas de tráfico de seres humanos. Em causa está o facto de explorarem em condições sub-humanas, de semiescravidão, centenas de trabalhadores estrangeiros em campos agrícolas da região e no centro do país.
De vez em quando a Comunicação Social faz-nos acordar para os direitos humanos e para a exploração dos trabalhadores, em especial dos trabalhadores migrantes que nos campos, fábricas e até em casas particulares, executam tarefas a troco de salário.
Sendo Portugal, desde sempre, um país de emigrantes, que conta atualmente com cerca de 2,3 milhões de portugueses espalhados pelo mundo fora, justo seria que acolhêssemos os que nos procuram para viver ou trabalhar da forma como gostaríamos que os nossos fossem recebidos lá fora.
Mas tal não acontece. Desde alguma animosidade contra (alguns) estrangeiros que procuram no nosso país melhores condições de vida, até a situação em que eles são explorados e deficientemente acolhidos, há exemplos vários que nos deveriam envergonhar.
Portugal precisa de crianças (nacionais ou oriundas de outros países) que façam do nosso país a sua pátria presente e futura de forma a colmatar os problemas que advém do envelhecimento da população.
E a nós compete olhar para todos os que nos escolheram para viver e trabalhar e assegurar que as condições em que trabalham e vivem estão em conformidade com a dignidade humana.
A nós compete questionar.
Têm contrato e condições de trabalho em conformidade com o estabelecido por lei, ou são vítimas de contratações à margem da lei e em condições desumanas?
Têm uma habitação adequada ou são vítimas de exploradores criminosos que arrendam espaços exíguos e sem condições a preços verdadeiramente imorais?
As crianças têm, nas escolas, os apoios necessários para acompanharem as aprendizagens exigidas pelo curriculum nacional?
E perante casos reprováveis de que tenhamos conhecimento devemos ter a coragem de abandonar os comentários em surdina, os “não me quero meter nisso”, “não sou responsável”, não é nada comigo” e enfrentar de frente o problema e procurar soluções adequadas, senão por dever de cidadania, pelo menos antes que alguém da Comunicação Social venha expor publicamente a nossa vergonha e a nossa culpa.
Tenhamos a coragem de exigir do governo central, das estruturas políticas de proximidade, da Segurança Social, da ACT (Autoridade para as Condições do trabalho) e de todos os outros organismos públicos e privados que defendem os direitos humanos que venham a terreiro identificar e solucionar todos os casos de atropelos à dignidade humana que começam a ser em demasia neste nosso país reconhecido por “bem receber”.
É que, quer queiramos, quer não, calar, virar a cabeça, fingir que não vemos, não nos exime de responsabilidades porque, como disse, um dia, Martin Luther King “O que me preocupa não é o grito dos maus, mas o silêncio dos bons”.
Fátima Flores, militante do PEV, eleita na Assembleia de Freguesia da União das Freguesias de Arcos e Mogofores
Rui Bastos, militante do PCP, eleito na Assembleia Municipal de Anadia