Club Tex em Anadia: Entrevista a Ivo MIlazzo

A 9ª Mostra do Clube Tex Portugal acontecerá, a 27 e 28 de abril, mais uma vez em Anadia. Publicamos, na íntegra, uma entrevista cedida pela organização do Clube Tex a Ivo MIlazzo, um dos desenhadores deste desenho animado.

 

Clube Tex (CT): O que representa para si este evento, que poderá contar com sua presença num país estrangeiro?

Ivo MIlazzo (IM): Voltar a Portugal, depois da última vez em Beja, será uma oportunidade para rever os amigos e para uma visita à cidade de Anadia, que há tempos acolhe uma importante iniciativa sobre uma personagem que se tornou um ícone italiano da banda desenhada.

CT: O que convenceu Ivo Milazzo, autor de fama mundial, a estar presente neste evento português dedicado a Tex?

IM: Este ano, na mostra Lucca Comics & Games, a SBE publicará uma versão dupla (para livrarias e de luxo) da história ‘Sangue no Colorado’, feita em 1998 a partir do argumento de Claudio Nizzi. Pareceu-me interessante divulgar o evento nesta ocasião dedicada a Tex e, ao mesmo tempo, comemorar um acordo com a Editora, que nos próximos anos publicará as histórias que criei ao longo da minha carreira para as personagens Nick Rider e Mágico Vento, em edição de capa dura para livrarias e não para bancas.

CT: Quais as suas expectativas em relação à 9ª Mostra do Clube Tex Portugal?

IM: Pode ser a oportunidade para conhecer melhor Lisboa junto com a colega brasileira Lu Vieira, artista emergente também em Itália. O seu conhecimento da língua permitir-me-á compreender melhor uma cultura que contaminou o próprio país e outros territórios durante o período colonial. A nossa sociedade foi formada por muitas culturas que se misturaram ao longo dos milénios em razão da migração constante. A realidade actual de povos que devem abandonar o próprio país devido ao condicionamento forçado de guerras, tiranias ou falta de alimentos, de cuidados e, muitas vezes, de direitos humanos essenciais, são só as dificuldades infinitas (expansionistas e religiosas) causadas por aquelas dominações distantes, jamais realmente resolvidas. Infelizmente a situação actual mostra que o homem nunca aprende com os seus erros e nem com os horrores de guerras inúteis.

CT: A ampliar um pouco o horizonte da entrevista: o que o convenceu a entrar na indústria dos quadradinhos?

IM: A aptidão inata para a narrativa por imagens levou-me ao seu porto natural, que, através das emoções do desenho, permite-me entrar em sintonia com leitores de diversos países. Provavelmente seja esse o sentido desta profissão e da minha própria existência.

CT: O que sentiu ao receber o convite para desenhar Tex?

IM: Na época havia terminado a longa parceria criativa com Berardi, o que nos permitiu criar muitas obras de grande valor. A história única para a série anual de Tex foi uma importante oportunidade criativa. Ou talvez um verdadeiro desafio para enfrentar uma personagem que acompanhou a minha infância em uma forte comparação com o estilo pessoal que eu havia aprimorado nos desenhos do meu Ken Parker, e buscar o correcto equilíbrio entre a minha visão narrativa e aquela que, a partir do pós-guerra, fascinou milhões de leitores em todo o mundo. Com respeito à personagem favorita de todos eles e à minha personalidade.

CT: Como analisa a evolução da sua carreira?

IM: Creio que permaneci focado por mais de duas décadas em expressar o meu desejo de contar histórias de aventura, sem analisar muito o que esse trabalho realmente significava. Depois disso, as mudanças inesperadas da vida foram a chave para observá-lo com outros olhos e compreender plenamente o seu papel mediático e cultural. E, sem dúvida, ajudou-me a compreender melhor a mim mesmo e aos outros.

CT: Como avalia seu trabalho hoje em relação ao passado?

IM: Quem realiza um trabalho ideativo tem a tarefa, senão o dever, de compreender as suas reais capacidades. Cada experiência pode ser uma oportunidade de olhar dentro do poço escuro e desconhecido da Criatividade. Se temos a coragem de seguir a curiosidade típica do hemisfério direito do nosso cérebro, podemos descobrir os infinitos recursos inatos e uma energia poderosa que a lógica da racionalidade nunca nos mostrará. Somente através dessa jornada trabalhosa um artista – ou um contador de histórias por imagens, como gosto de me definir – pode experimentar as armas potenciais da sua própria mente e do seu talento expressivo pessoal.

CT: Como se forma um desenhador do seu nível?

IM: Creio que o maior obstáculo é entender qual é o talento individual, aquele que os antigos gregos chamavam de daimon – expresso nos justos limites pessoais para evitar transformá-lo em um demónio nefasto – e que a mais remota Índia definia como dharma no significado de Virtude. Se a compreende, essa vocação precisa ser acreditada, cultivada e desenvolvida através de um caminho específico em dinâmicas operacionais que permitam a ela emergir com força. Acreditar nos próprios recursos é a única certeza real que nos acompanha para nos tornarmos pessoas realizadas e existencialmente privilegiadas.

CT: No que está a trabalhar actualmente?

IM: Terminei recentemente um livro que reúne as histórias curtas criadas nos anos 2000, no qual incluí um ensaio sobre Criatividade. Ao tomar consciência de que o tema era geralmente tratado com superficialidade e quase com conhecimento óbvio, pude verificar que, na realidade, sobre ele quase nada se descobriu de forma científica, muito menos sobre a fonte da intuição. E eu mesmo também sabia muito pouco a respeito, depois de mais de cinquenta anos de profissão. Então, que melhor oportunidade do que essa para aprofundar o tema, ao viver numa sociedade condicionada de uma forma que gera ansiedade pelos efeitos do pensamento racional focado no lucro e na imortalidade?

CT: O que Tex representa para si e qual a importância dele na sua vida?

IM: Talvez um visionário estímulo adolescente para me tornar o autor que sou hoje.

CT: Para concluir, quer deixar uma mensagem aos seus admiradores que irão a Anadia?

IM: Será um enorme prazer encontrá-los para se apertar as mãos, olhar nos olhos e compartilhar a emoção de se conhecer.


TRADUÇÃO: JÚLIO SCHNEIDER

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