Opinião por Carlos Vinhal Silva: O drama democrático

No âmbito da democracia, por definição, a vontade do povo é soberana, que serve como a pedra angular sobre qual as sociedades são construídas, oferecendo igualmente uma plataforma que dê espaço para que vozes política e ideologicamente diversas sejam ouvidas e decisões sejam tomadas coletivamente. No entanto, inerente ao processo democrático, encontramos a necessidade de reconhecer que nem todos os resultados estarão alinhavados com os nossos desejos ou crenças individuais. E, ainda assim, é precisamente esta aceitação de desfechos diversos que sublinha a força e a resiliência dos princípios democráticos.

A democracia, por natureza, é um mecanismo político que permite navegar entre os desacordos e disputas dentro de um quadro de civismo e respeito, operando com base no princípio de maioria (que pode constituir aquilo que, em Filosofia, se designa por falácia informal ad populum, mas esse assunto ficará, eventualmente, para outro artigo) que reconhece que, inevitavelmente, há vencedores e vencidos no processo eleitoral. Contudo, embora seja natural celebrar vitórias, é essencial que recordemos permanentemente que a legitimidade da democracia reside, precisamente, na sua capacidade de acomodar todos os resultados, mesmo aqueles que possam ser considerados indesejáveis ou impopulares.

E é assim porque um dos conceitos nucleares da democracia é este: cada indivíduo tem direito a uma voz e a um voto. E, entre crenças e ideias tão díspares, inevitavelmente, haverá quem não fique satisfeito com o resultado democrático e com o rumo que uma determinada nação poderá seguir num determinado momento, mas é necessária a compreensão de que o estabelecimento de compromissos é essencial para uma sociedade funcional. Adicionalmente, a aceitação de todos os resultados, mesmo aqueles que não desejamos ou concordamos, é crucial para a preservação das normas e instituições democráticas: numa democracia saudável, a primazia da lei e a integridade dos processos eleitorais devem ser mantidas, independentemente de quem emerja como vencedor. Rejeitar ou minar a legitimidade dos resultados eleitores estabelece um precedente perigoso capaz de erodir as próprias bases da democracia.

Naturalmente, isto não implica que devamos aceitamos passivamente a injustiça ou a opressão em nome da democracia. Pelo contrário, ser democrata exige um envolvimento ativo e vigilância para garantir que os direitos e liberdades de todos os indivíduos se encontram protegidos, sempre dentro dos princípios e normas democráticas, por meio de protestos e manifestações pacíficas, recursos legais e, sobretudo, pela urna de voto. Definitivamente, a democracia não constitui uma garantia de que a nossa vontade será realizada, mas antes um compromisso de nos esforçarmos para ultrapassar diferenças e divergências em nome de um bem maior. Ao aceitar todos os resultados democráticos, mesmo aqueles que não desejamos ou concordamos, estamos a reafirmar o nosso compromisso com os princípios fundamentais da democracia: igualdade, representação e respeito pela lei. Porque apenas pelo meio dessa aceitação somos capazes de garantir a vitalidade e a resiliência contínuas do governo democrático, tanto no presente como para as gerações futuras.

 

por Carlos Vinhal Silva

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